Mindelo, Cabo Verde, 14 Nov (Inforpress) – Nelson Atanásio foi dos poucos a acreditar numa Fazenda de Camarão, uma ideia que nasceu há 10 anos, cuja produção começou há três, até agora com máximo de 25 toneladas, mas prevê produzir 300 toneladas para exportação.
“Havia necessidade de fazer uma produção de camarão capaz de substituir a importação que anualmente se faz e também exportar, porque o nosso clima é bom, o nosso mar é limpo e nós fazemos camarão com água do mar. Trabalhamos em terra com água do mar para fazer comida”, começou por afirmar à Lusa Nelson Atanásio Santos, um dos promotores.
A ideia surgiu há 10 anos, mas o projeto só ganhou forma graças à “teimosia” de Atanásio, 77 anos, natural da Boa Vista, ilha onde o camarão aparece nas ribeiras após as chuvas.
“Nas férias apanhava camarão nas ribeiras, depois eu li a experiência brasileira em relação à criação deste tipo de camarão em lagoas e então engendrámos um projeto”, explicou, referindo que se trata de um “projeto familiar”, com investidores cabo-verdianos e brasileiros.
Apesar de ser apreciado no mundo inteiro, Cabo Verde não tinha uma pesca organizada de camarão e consome por ano à volta de 150 toneladas deste marisco, que importa de várias partes do mundo, nomeadamente do Senegal, explicou o promotor, formado em Administração, tendo sido oficial do exército português delegado do Governo, e é atualmente presidente da Câmara Municipal de São Vicente, ilha onde reside desde 1984.
Assim, os promotores concorreram a um financiamento neerlandês e ganharam, e em 22 hectares na ribeira de Calhau, em São Vicente, construíram 10 viveiros grandes e 18 pequenos, sendo que, desses, 20% estão em plena utilização.
No primeiro ano, a fazenda produziu 12 toneladas de camarão, aumentando para 25 no segundo e neste ano já vai em 15 toneladas, com Nelson Atanásio a acreditar que poderá chegar a 30 toneladas até final do ano.
Mas as ambições são maiores e garantiu que o local tem capacidade para produzir 300 toneladas de camarão por ano e que isso justifica “apostar na exportação”, sobretudo para o mercado europeu.
“O projeto está montado. Nós produzimos as nossas próprias larvas, temos neste momento viveiros suficientes, falta o investimento e possibilidades para exportar. Porque Cabo Verde não vai conseguir consumir aquilo que vamos produzir”, considerou.
Entretanto, lamentou a logística “extremamente deficiente” de Cabo Verde para exportação, mesmo entre as ilhas, com dificuldades em mandar o marisco para a Praia, o principal mercado consumidor, ou mesmo para as ilhas do Sal e da Boa Vista, as duas mais turísticas do arquipélago.
“O transporte entre as ilhas é muito castigador para nós, mas é o que nós temos e vamos fazendo”, referiu o promotor do projeto, em que já foram investidos mais de 300 milhões de escudos (mais de 2,7 milhões de euros).
Nelson Atanásio descreveu o camarão produzido no Calhau como sendo “limpo”, visto que não há qualquer esgoto a desaguar para o mar num raio de cinco quilómetros do Calhau e os animais são alimentados a farinha de peixe de São Nicolau e sêmea de trigo produzido localmente.
Projetada para trabalhar com 85 pessoas, neste momento a Fazenda de Camarão tem 30 funcionários, na sua maioria mulheres, sobretudo da ribeira de Calhau, localidade que vive essencialmente da pesca, agricultura e pequeno comércio.
Outro aspeto destacado pelo promotor é que a Fazenda produz atualmente 18% de sua energia, projetando para dezembro chegar a 80%, quer solar, quer eólica.
Além da produção do camarão, Nelson Atanásio deu conta que o viveiro está equipado para produzir tilápia para fazer a substituição do isco para o atum tradicional.
“Não tenho dúvidas de que esta é uma valência terrivelmente boa, válida para o país, para a indústria de pesca e para possibilitar que os juvenis que são capturados cresçam”, salientou.
Mas, para ficar completo, disse, o projeto precisa de mais financiamento, para, por exemplo, encher os outros viveiros e montar uma pequena unidade de frio, que serviria não só a Fazenda de Camarão, mas também os pescadores da zona do Calhau.
Defendeu ainda que é preciso que as universidades olhem para o projeto “com outro olhar”, como local de estudo, estágio e intercâmbio, mas também para a criação de outros peixes em terra.
Na Fazenda, um quilo de camarão custa 800 escudos (7,6 euros), “menos do que metade do preço do camarão importado”.
“Estamos contentes porque a população cabo-verdiana anda a comer bastante camarão […] e um camarão de qualidade”, garantiu.
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