REPORTAGEM: Cães em Cabo Verde ganham amigos neerlandeses e quase 600 já foram castrados

Paul, Cabo Verde, 31 Out (Inforpress) – De férias no concelho do Paul em 2017, um casal neerlandês constatou o problema dos cães nas ruas em Cabo Verde e conseguiu desengavetar um projeto que já castrou cerca de 600 animais e quer fazer muito mais.

O casal Caspar Braekman, veterinário, e Íris Van Maarschalker-Waart, advogada, dos Países Baixos, queria implementar um projeto do tipo em algum lugar do mundo, mas não sabia onde, até que chegaram ao Paul, ilha cabo-verdiana de Santo Antão.

“Entretanto, vieram de férias para Cabo Verde em 2017 e depararam-se com o problema dos cães, que eram muitos, e decidiram fazer isso aqui”, contou à Lusa Marlene Pires Delgado Polaz, voluntária do projeto comunitário, denominado “Um cão, um amigo”.

Depois de vários contactos, com apoiantes e financiadores, os trabalhos começaram em abril de 2019, com uma campanha de castração em Ponta do Sol, seguida de outra, em novembro do mesmo ano, no Paul.

“Mas ainda restavam muitos cães e decidimos fazer a mesma coisa em 2020”, recordou a mesma responsável, lamentando o surgimento da covid-19, que limitou movimentos e obrigou os promotores a criar uma clínica na zona do Paço.

“E já temos quase 600 cães castrados a nível de Santo Antão, a maior parte nos concelhos do Paul e da Ribeira Grande”, contabilizou Marlene Pires Delgado, que é natural da Ribeira Grande.

Um dos primeiros a levar o seu cão para castração no projeto “Um cão, um amigo” foi Ricardino Maria Francisca, de 71 anos, morador há cerca de 30 anos na zona de Coqueiro, em Paul de Baixo, a menos de mil metros de distância da clínica.

E desde então, os voluntários sempre o vão visitar na sua moradia, um piso térreo onde vive sozinho, tendo como companhia dois gatos e agora apenas um cão, já que outro foi atropelado mortalmente à porta de casa.

“É um bom trabalho, porque existem muitos cães abandonados, que transmitem doenças, e fazer a sua castração, bem como dos gatos, é muito bom. É que há muita gente com animais, mas não têm condições para os sustentar, vigiá-los, porque também merecem consideração”, disse.

O septuagenário emociona-se quando fala dos animais de estimação, que chama de “meninos” e critica as pessoas que os maltratam.

“É um projeto muito bom, de várias formas”, reforçou Ricardino Francisca, que já tem dificuldades de visão e de locomoção, pelo que não larga a sua bengala para dar passos no quintal de casa, e já não pensa arranjar mais animais.

Só na ilha de Santo Antão, Marlene Delgado estima que há mais de dois mil cães, muitos de rua, pelo que reconheceu alguma resistência das pessoas logo no início com o projeto de castração, mas agora as pessoas estão mais à-vontade e mais conscientes do problema na ilha mais a norte do país.

E por isso agora o telefone não para de tocar, com pessoas a pedirem ajuda para os seus cães, para os que estão nas ruas e até para os do vizinho.

Com cerca de 30 voluntários, entre eles veterinários, o projeto já foi também às localidades de Janela, Pico da Cruz e Sinagoga, e os promotores querem reforçar as ações em Ribeira Grande e Porto Novo, e não descartam a hipótese de viajar para outras ilhas do arquipélago.

Em praticamente todas as ilhas de Cabo Verde, há o problema da proliferação de cães nas ruas, que fazem barulho, vasculham o lixo e atacam outros animais e, muitas vezes, pessoas.

“Temos muitos voluntários e eles estão sempre disponíveis, querem ajudar e, se abrirem portas, porque não?”, manifestou à Lusa, referindo que os promotores estão agora também a envolver as crianças, através de ações nas escolas primárias.

“É a melhor estratégia que há. Já vão chegar em casa e passar a mensagem do que aprenderam na escola, já vão ver as coisas de forma diferente, de como tomar conta dos seus cães e os dos amigos. É muito interessante ver como estão mesmo dispostas a ajudar”, notou.

O projeto conta ainda com apoio das câmaras municipais do Paul e da Ribeira Grande, de veterinários profissionais, disse Marlene Delgado, destacando ainda o “muito envolvimento” do Ministério da Agricultura e Ambiente.

Na segunda-feira, chega a Cabo Verde um grupo de 10 veterinários e técnicos assistentes, entre eles o casal de neerlandeses e investigadores, para cerca de duas semanas de campanha na Ribeira Grande e Porto Novo, para tentar solucionar o problema dos ataques dos cães e outros animais.

“É um problema que temos e para o qual ainda não encontrámos uma solução e que gostaríamos muito de poder ajudar. Se pudermos fazer mais trabalhos de pesquisa, não só com os cães, mas também com as pessoas, acho que podemos ajudar muito no desenvolvimento da sociedade”, salientou a voluntária do projeto “Um cão, um amigo”.

Na sua página oficial, o projeto diz que quer ajudar a ilha de Santo Antão a resolver o problema dos cães em espaços públicos e dos ataques ao gado, implementando uma gestão humana da população e fazer dessa ilha “um exemplo” para Cabo Verde.

Inforpress/Lusa/Fim

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